98 Telinha e seus gatinhos

no dia que eu me zangar
mato voce de carinho

Ze´ Limeira

26.12.02

que no ano novo essa história não se repita...

O VeLHO, O MeNINO E O BuRRO
por Raimundo Carrero

Um velho carregando um burro nas costas? Duvidoso. Um velho e um menino carregando um burro nas costas? Ainda mais duvidoso. A cena pode parecer insólita e, mais do que insólita, grosseira. Isto é: para quem tem alma burocrática. Para quem vive num país onde o ridículo e penoso se misturam, nada mais real. Nada mais absolutamente real. É verdade.
O velho, este Brasil tradicional e antigo, insiste em caminhar em direção ao passado enquanto o Brasil burro, radical e prepotente, carrega nas costas o Brasil menino, livre e esperto. E há quem diga: Não tem vergonha, não? O velho não é respeitado, enquanto o burro carrega o Brasil menino? A situação se refaz: O velho monta no burro e o menino vai a pé. Bronca outra vez.
Não tem vergonha, não? Um velho montado num burro, deixando o menino caminhar cansado? E os dois: o velho e o menino decidem carregar o burro nas costas. E relinchando. É claro.
Moral da história: Enquanto o tradicional e o renovador brigam, o burro domina a nação.


Raimundo Carrero é escritor, autor de, entre outros, "Sombra Severa" e "As Sombrias Ruínas da Alma" (ed. Iluminuras).


Os ouvidos de cada um
Na fábula do grego Esopo, que viveu entre os séculos 7º e 6º a.C., um lavrador decide vender seu burrico e leva-o à feira, acompanhado de seu filho. Os dois seguem a pé, puxando-o pelo cabresto, para que o burro chegue descansado. Lavradores e mercadores que os vêem passar sucedem-se em reclamações: uns julgam que estão fazendo penitência, o que leva o pai a ir montado no animal. Algumas mulheres consideram desaforo o menino seguir a pé, e o pai faz o filho montar na garupa. Outros exclamam que "o pobre animal já nem fôlego tem", então o lavrador decide deixar apenas o filho montado, seguindo a pé. Um outro ironiza tratar-se de um príncipe seguido de seu lacaio. "Não podemos dar ocasião a tais afrontas; filho, carreguemos o burro às costas." Assim fazem e alguns rapazes desatam a rir diante da cena. "Qual dos três é mais burro?", perguntam. "Sou eu, responde o lavrador, "que por todo o caminho dei ouvidos a cada um."