98 Telinha e seus gatinhos

no dia que eu me zangar
mato voce de carinho

Ze´ Limeira

9.1.05

eu tenho roupas que dormem.
elas dormem numa bolsa no guarda-roupa até que um dia eu vou mexer na bolsa e acordar as roupas.
roupas que já têm muito tempo. cuja moda já passou. roupas que eu comprei e não usei. roupas que não cabem mais em mim.

hoje eu acordei as roupas.
vi o vestido bonito da loja cara. usei num casamento ou numa formatura? nunca mais usei. vamos ver como ele fica.
a calça jeans preta e perfeita. nunca houve um jeans que me vestisse tão bem. tá lá, esperando.
uma blusa chique de seda, listrada de azul marinho. olho para ela, ela olha para mim. eu separo.
uma blusinha preta com aplique de renda colorida. eu amo esse aplique de renda colorida, que morou anos numa sacola dentro da máquina de costura da minha mãe até que eu pedi ele para mim. vou provar.
uma blusa preta, manga comprida, inadequada para esse calor absurdo. vale a pena tentar.
o vestido cinza de quando meu manequim era 42. vai chegar sua hora, baby. nem que seja para eu admitir que não gosto mais de você.
o corselete-princesa, também preto. como eu tenho roupa preta!
uma blusinha branca com rosinhas feitas com fita de cetim. nunca usei. mas não vai ser dessa vez que eu vou doar.

páro.
dobro as roupas, guardo na bolsa de novo.
levo as que separei para o banheiro.
experimento. olho no espelho. hm. hm-hm.
provo o vestido. apertado no busto. menos uns quilos aí e ele vai ficar legal.
a blusa listrada vai ser doada. nem provei: acho que tem cara de senhôra.
a blusinha com aplique fica perfeita e vai sorrindo pro guarda-roupa. só preciso passar a ferro.
a preta de manga comprida veste folgadinha. no inverno vai ficar mais ainda. ainda assim, vai pro guarda-roupa.

os coletes. houve um tempo, uma vida atrás, que eu adorava coletes. cheguei a ter treze. esse tempo passou. os coletes ficaram. todos para doação. menos um, o mais bonito. esse fica.

duas blusinhas lindas e fresquinhas que vão embora. eu vi what not to wear. são o modelo mais errado possível para mim. alguém vai usar e vai ficar muito feliz com elas. são lindas, ué.

dessas roupas que dormiam e que eu examinei com olhar crítico, uma sacola cheia foi embora. das que ficaram, umas eu vou voltar a usar agora. outras, daqui a uns meses.

ficou um negócio na minha garganta. um travo. e herbert vianna me traduz

"eu hoje joguei tanta coisa fora
vi o meu passado passar por mim
cartas e fotografias, gente que foi embora
a casa fica bem melhor assim"